Alface: entenda o que é tipburn, por que ocorre e como minimizar

Por Natalia Teixeira Schwab, Universidade Federal de Santa Maria

14.06.2025 | 15:59 (UTC -3)

Tipburn, também conhecida também como queima-das-pontas ou queima-dos-bordos, é uma desordem fisiológica que acomete a cultura da alface. Causa, esporadicamente, graves perdas nas áreas de produção. Esse problema costuma aparecer quando há um desequilíbrio nutricional no ambiente; ou quando os níveis de radiação solar (e, consequentemente, a temperatura do ar) são elevados, o que normalmente ocorre nos cultivos que transcorrem durante os meses de verão e primavera. Ou quando as condições ambientais limitam a transpiração da planta.

Tal desordem afeta a qualidade visual e a vida útil do produto, inviabilizando sua comercialização devido à rejeição por parte do consumidor, conferindo perdas econômicas para o produtor.

O que é tipburn

Tipburn é uma desordem fisiológica causada pela deficiência de cálcio. Pode ocorrer em razão de ausência do mineral no ambiente. Ou em situações em que esse elemento está presente e disponível, porém não é adequadamente distribuído nos tecidos da planta.

O cálcio é um macronutriente essencial na manutenção da parede celular e estrutura da membrana. Ele funciona como elemento cimentante que tem o intuito de garantir a integridade dessas estruturas. As plantas podem tornar as paredes celulares mais rígidas ou plásticas; e as membranas mais ou menos permeáveis dependendo da concentração de cálcio. Portanto, quando seu fornecimento é insuficiente (por deficiência) ou inadequado (por má distribuição interna), há enfraquecimento e rompimento da parede e membranas das células, resultando no extravasamento do conteúdo celular e, consequentemente, necrose dos tecidos. A essa necrose damos o nome de Tipburn.

Na alface (Lactuca sativa), tal necrose dos bordos é especialmente marcante devido à presença de vasos lactíferos repletos de látex, que é um produto vegetal com aspecto leitoso, secretado nas folhas e caules de plantas do gênero Lactuca. O látex é responsável pelo amargor das folhas. Quanto maior sua concentração (menor conteúdo de água nos tecidos), mais desagradável tornar-se-á o sabor da folha.

Assim, quando há o rompimento da célula e extravasamento de seu conteúdo resultante da ausência do cálcio, há liberação do látex no tecido circundante, causando colapso do parênquima e oclusão de elementos do xilema. A área atingida perde rapidamente o turgor e células dispersas do mesofilo tornam-se necróticas.

O transporte do cálcio da raiz até as folhas se dá via transporte de água no xilema, através do fluxo transpiratório. Quando armazenado no seu destino para cumprimento da função estrutural, raramente é remobilizado, sendo, portanto, considerado um elemento não-móvel ou de mobilidade limitada na planta. Em outras palavras, podemos dizer que o cálcio só pode ser fornecido por transpiração e não por meio de armazenamento ou alocação, o que faz com que sua deficiência ocorra primeiramente nos pontos de crescimento (zonas meristemáticas).

Como as folhas maiores e mais velhas da alface (que se localizam na parte externa da roseta) transpiram mais, tendem a acumular mais cálcio do que as folhas menores e mais jovens (que se localizam na parte interna da roseta). Dessa forma, os sintomas de Tipburn costumam aparecer nas folhas ocupam as posições mais internas da planta.

<i>Tipburn</i> em alface lisa (à esquerda) e crespa (à direita)
Tipburn em alface lisa (à esquerda) e crespa (à direita)

Por que ocorre

Como citado, há três situações mais difundidas a que é possível atribuir a ocorrência do Tipburn: deficiência de cálcio, níveis de radiação solar e temperatura do ar elevados e condições ambientais que limitem a transpiração da planta.

A primeira situação, de simples compreensão, se dá pela pura ausência do elemento cálcio no sistema produtivo. Não estando presente, tal deficiência nutricional irá resultar em problemas na formação da parede celular que irão repercutir no seu rompimento e, consequentemente, na formação de necrose nos tecidos. Essa situação é a menos frequente e, também, a mais fácil de ser solucionada.

A segunda e terceira situações pressupõem a presença e disponibilidade do cálcio no ambiente produtivo. Porém, como tratam de características microclimáticas específicas e momentâneas da lavoura, são imprevisíveis e de compreensão e diagnóstico um tanto mais complexo.

Na segunda situação, em que os níveis de radiação solar (e, consequentemente a temperatura do ar) do ambiente encontram-se elevados, o rápido crescimento da planta induzido por essas condições pode não ser acompanhado pela capacidade de absorção do sistema radicular e fluxo de água e cálcio pelos vasos condutores. Dessa forma, haverá atraso entre a demanda nos pontos de crescimento (bordos das folhas jovens) e a capacidade de captura da raiz e distribuição pelo sistema vascular. Esse descomo gerado por estresse abiótico, que é ível de ocorrer nos cultivos de primavera e verão, irá resultar em deposição insuficiente de cálcio nas bordas das folhas jovens e, consequentemente, Tipburn. Diversas pesquisas realizadas sobre esse tema demonstraram que o aumento na intensidade da luz resulta em maior ocorrência dessa desordem em alface (Gaudreau et al., (1994); Wissemeier e Zühlke (2002); Sago (2016); Knoop (2019)). Para Bárcena et al. (2019) alta intensidade de luz aumenta a taxa de crescimento das plantas, podendo afetar a ocorrência de Tipburn.

A terceira situação vem no sentido contrário da segunda apresentada. Nesse caso, ao invés de uma demanda acelerada (e consequentemente um fluxo entre solo-planta-atmosfera que não é atendido), apresentam-se circunstâncias onde o fluxo é totalmente interrompido ou reduzido a níveis ínfimos. Como já visto, o transporte e ascensão do cálcio na planta se dá em função da transpiração. Portanto, quando plantas de alface são submetidas a condições que interrompam (ou reduzam a taxas muito pequenas) a transpiração através do fechamento dos estômatos, haverá ocorrência do Tipburn.

Segundo Saure (1998) existe uma correlação positiva entre alta umidade relativa do ar (UR) e a ocorrência de Tipburn. Em 1976, Tibbitts e Bottenberg descobriram que a taxa de crescimento aumentou drasticamente para alface cultivada sob 85% de UR, em comparação com alface cultivada sob 50% de UR. Isso pode sugerir que o aumento da UR afeta o Tipburn por meio de seus efeitos na taxa de crescimento da planta. Knoob (2019) observou em estudo que nos tratamentos onde a alface foi submetida a uma combinação de alta intensidade de luz e alta UR, e a ocorrência de Tipburn foi mais severa. Quando a UR é alta, o déficit de pressão de saturação de vapor é baixo, havendo, portanto, redução da taxa transpiratória.

Essa situação pode ocorrer quando, por exemplo, em dias com alta umidade relativa do ar, não há déficit de saturação de vapor entre o estômato e o ambiente, o que resulta no fechamento estomatal. Estando o fluxo interrompido, o cálcio não chega nos pontos meristemáticos onde é demandado e assim, também poderemos observar a ocorrência de Tipburn.

Como minimizar o problema

Embora a alface possa ser cultivada ao longo do ano todo, ela é considerada uma hortaliça de clima temperado e tende a adaptar-se melhor sob temperaturas amenas, com média entre 15 e 24ºC. Dessa forma, os maiores desafios relativos à ocorrência de Tipburn ocorrerão nos cultivos realizados durante os períodos mais quentes do ano e com alta intensidade luminosa (meses de primavera e verão).

Para esses períodos recomenda-se a utilização de cultivares que apresentem tolerância à queima-dos-bordos tanto em cultivo a campo quanto em cultivo protegido.

Não há procedimentos de manejo recomendados que garantam a prevenção do Tipburn. No entanto, para cultivos a campo, onde o controle ambiental é reduzido, o problema poderá ser diminuído pela colheita antes da maturidade completa da planta, de forma com que os sintomas não se desenvolvam suficientemente para afetar a comercialização da alface.

Já para cultivos em ambiente protegido, onde o manejo do microclima é possível, procedimentos tais como: manutenção de umidade adequada junto ao sistema radicular; manutenção de um déficit de pressão de vapor na atmosfera da estufa proporcionado pela movimentação de ar sobre o dossel de plantas; e controle nos níveis de radiação com o uso de telas sombreadoras de forma a não permitir o crescimento das plantas a taxas demasiadamente acelerada, parecem minimizar a ocorrência do TipBurn.

É relevante destacar que nos cultivos em períodos mais quente (temperaturas médias acima de 20ºC), também poderá ocorrer estímulo ao pendoamento precoce, outra desordem fisiológica que inviabiliza a comercialização da alface. Neste caso, deve-se optar por cultivares que também apresentem tolerância ao pendoamento. O chamado pendoamento precoce, além de induzir a planta a florescer antecipadamente, estimula à produção de látex, substância que causa amargor nas folhas.

Por Natalia Teixeira Schwab, Universidade Federal de Santa Maria

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